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2000/FEV/26

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Surrealismo: do Cabo Mondego… para o Mundo

Miguel Fileno Carvalho em Destaque
ao centro na foto

Na Figueira da Foz têm-se idealizado e realizado encontros em nome desta ideologia; na Figueira da Foz têm passado, ultimamente, os mais activos surrealistas de todo o mundo. Na Figueira da Foz tem passado despercebida a existência de uma editora (a única em Portugal e uma das muito poucas na Europa) que se dedica exclusivamente à actividade editorial (embora ainda com pequena produção) focada unicamente no Surrealismo. Falamos de DEBOUT SUR L’OEUF, dirigida pelo livreiro antiquário figueirense Miguel de Carvalho residente no Cabo Mondego.
Com uma importante exposição de Cruzeiro Seixas – um dos fundadores do movimento surrealista em Portugal, ainda vivo – decorrida em 2003, a Figueira da Foz tem sido, desde então, um palco quase nuclear das actividades surrealistas portuguesas, uma vez que é (d)aqui que têm nascido os últimos projectos com projecção internacional.
Na linguagem comum, a designação de surrealismo e o adjectivo surreal (embora na sua vastíssima obra André Breton apenas o tenha utilizado duas vezes) aparecem frequentemente nos media, e até na Assembleia da República, ligados à ideia de algo que parece saído de um sonho, uma situação caricata ou inverosímil. Mas o surrealismo não é, defendem os surrealistas, um movimento artístico. É, afirmam, muito mais do que uma corrente de pensamento, muito mais do que o que a razão e a lógica – que não lhes bastam nem lhes servem – conseguem expressar em palavras. Numa tentativa vã, pode arriscar afirmar-se que é uma forma de estar na vida, de sentir a vida, de viver e de, ao longo desse acto, ir interagindo com a vida, tendo como pilares a poesia (não como estilo literário mas, parafraseando Andre Breton, como “perfeita compensação das misérias que padecemos”), a liberdade e o amor, numa tríade em que o desejo, entendido como “único impulsionador do mundo e único rigor que o homem se deve impor”, é simultaneamente o mínimo e o máximo denominador comum.

No Cabo Mondego, onde a terra acaba e começa e o mar começa e acaba, sem horizontes que lhe antecipe o fim, o surrealismo vive, cria e agita. Fomos conhecer o “Cabo Mondego Section of the Portuguese Surrealism”.
Não é um grupo surrealista, pois não têm manifesto, nem querem ter. O nome designa ‘apenas’ a actividade colectiva exercida por um conjunto flutante de pessoas, cuja liberdade é feita pela poesia e pelo amor. Quem por lá passa, à secção pertence.
O pintor Rik Lina e a sua esposa, a ceramista Elizé Bleys, estão na Figueira da Foz pela quarta vez desde 2007. O casal holandês habita uma casa amarela com vista para o mar e para a serra. Foi na sala colorida com as cores e as texturas das suas pinturas e assemblages que os dois artistas receberam a reportagem de O Figueirense, numa tarde em que, como em tantas outras, desfrutavam da companhia do pintor portuense Seixas Peixoto, há muito a viver na Figueira da Foz, e do livreiro e editor figueirense Miguel de Carvalho. A faltar – e a fazer falta, sublinharam todos – estava o escritor conimbricense João Rasteiro. Quando juntos, constituem o núcleo do “Cabo Mondego Section of the Portuguese Surrealism”, um pólo que é sobretudo um local de encontro e de partilha de criações, de ideias, de vivências e de visões. Porque, defendem, “ao contrário do que pretendem a maioria dos críticos de arte e dos académicos, que necessitam que o surrealismo esteja morto para fazerem carreira sem que ninguém lhes faça frente, o surrealismo está vivo. Porque, garantem, o surrealismo viverá enquanto houver Humanidade, porquanto poesia, liberdade, amor e desejo são características que definem o humano, como o são a locomoção erecta ou a memória.
Uma editora surrealista
A designação DEBOUT SUR L’OEUF (DSO) surgiu em 2006 do convívio entre Miguel de Carvalho e Cruzeiro Seixas, a propósito da necessidade de criar uma revista dedicada ao surrealismo, com fim de divulgar o que se pratica tanto cá como além fronteiras. Desta revista ainda não saiu o primeiro número (está na forja – garante o editor), mas o nome deu origem às edições artesanais que o livreiro-editor concebe, assim como ao manifesto das exposições que, periodicamente, acolhe no seu espaço em Coimbra. Cruzeiro Seixas, o grupo surrealista checo “Stir Up” e Rik Lina, são, entre muitos outros, alguns dos nomes que já lá expuseram, sem fins comerciais: as edições artesanais, por exemplo, ficam-se pelos 30 ou 40 exemplares, que acabam nas mãos de alguns surrealistas de todo o mundo, ou nas mãos de alguns coleccionadores atentos às movimentações dos surrealistas, como testemunho de uma união sem fronteiras, e não em resultado de trocas com valor comercial.
Da mesma forma se produziram as actividades desenvolvidas em 2008, de que se destaca a exposição internacional de surrealismo actual “O Reverso do Olhar”, que esteve no Edifício do Chiado e na Casa da Cultura de Coimbra, trazendo àquela cidade a maior exposição de surrealismo actual em todo o mundo dos últimos 30 anos. Ao todo participaram 160 surrealistas, com mais de 320 obras de pintura, fotografia e esculturas, para não mencionar as dezenas de publicações periódicas e livros sobre a matéria. No mesmo ano, na Galeria Municipal Artur Bual, na Amadora, os surrealistas mostraram-se através da DSO em “A Voz dos Espelhos”, uma exposição que contou com intervenções de Seixas Peixoto, Rik Lina, Alfredo Luz e Miguel de Carvalho, assim como com a declamação de poesia de João Rasteiro e Alfredo Luz.
Já este ano, em Janeiro, dezenas destes surrealistas – por definição avessos aos poderes instituídos e modeladores, sejam eles políticos, religiosos ou outros – surpreenderam ao inaugurar uma exposição com o apoio municipal num convento: foi no Convento de S. José, em Lagoa, com a abertura a ser feita à luz das velas, entregues individualmente aos visitantes. “O Marcel Duchamp já o fizera em 1938, em Paris”, fez notar Miguel de Carvalho lembrando que o título do evento era exactamente “Iluminações Descontínuas”.
Cadavre exquis
É um dos ‘jogos’ que mais seduz os surrealistas. Consiste na prática colectiva de desenhos e/ou escritos. Cada um dos participantes executa livremente o seu desenho ou escrito sem tomar conhecimento do que fizera o participante anterior com cujo trabalho tem continuidade. Deixa apenas visível uma pequena secção (riscos ou palavras) por onde se inicia a intervenção do participante seguinte. Elabora-se sucessivamente esta técnica até se esgotarem a totalidade das participações no jogo. No final, destapa-se todo o conjunto para apresentação do resultado global. A imagem resultante constitui assim uma surpresa e um inédito: nunca seria possível a sua obtenção de um único cérebro. Um dos aspectos fundamentais desta prática de jogos é a noção de acção colectiva. Defensores do automatismo e do acaso objectivo, da espontaneidade que não permite outra regra que não a ausência de regras, os surrealistas privilegiam o trabalho colectivo. Na exposição da Amadora, uma tela de seis metros foi assim executada na inauguração, entre participantes e público. Outra das técnicas criativas a várias mãos consiste em, simplesmente, partilhar em simultâneo o acto de criação. Foi o que aconteceu na exposição de Coimbra “O Reverso do Olhar”, com uma sessão de pintura automática ao vivo durante o vernissage, com a presença de pintores automatistas costariquenhos, argentinos, holandeses e franceses. “É como uma sessão de jazz (note-se que esta modalidade musical está conectada ao surrealismo exactamente pelo automatismo), cada um pinta livremente, como quer e como sente, e tudo se encaixa, numa melodia visual”, ilustrou Seixas Peixoto. O automatismo e a acção colectiva são duas formas de estar essenciais no Surrealismo. Surrealismo: um mundo sem fronteiras
Mas como se conhecem, como se relacionam, os surrealistas de todo o mundo? “Há quem trabalhe sobretudo sozinho”, reconhecem os surrealistas da Secção do Cabo Mondego. Mas muitos sentem que o automatismo e jogos como o cadavre-exquis contribuem para o plano superior do maravilhoso a que rumam. “O maravilhoso é sempre belo, qualquer maravilhoso é belo, e mesmo só o maravilhoso é belo”, sintetizou André Breton. Por isso, e porque a Internet fez da aldeia global pouco mais do que uma casa com um muitas divisões e ainda mais portas, os surrealistas de Portugal e os da Holanda, mas também os da Colômbia, do Chile, da Argentina, do México ou do Brasil, entre muitos outros oriundos de cerca de 30 países, não têm dificuldade em manter-se em contacto. Criam para uma plataforma comum, que se materializa nas revistas surrealistas “Brumes Blondes”, “Tortue-Lievre”, “Superieur Inconnu”, “Pleine Marge”, “InfoSurr”, “Styx” e “Cahier de L’Umbo”, entre outras, e organizam-se em grupos, por afinidades, para facilitar intercâmbios. E claro, muitos – como Rik e Elizé – viajam. “Quem já fez pequena fortuna à custa do surrealismo foram os Correios, cujos serviços são diariamente utilizados para trocas de publicações e obras originais”, diz, sorrindo, Miguel Carvalho.
Rik Lina e Elisé Bleys
Hoje, o casal já pode ‘dar-se ao luxo’ de largar ‘tudo’ para procurar, em novos lugares, novas matérias digeríveis para os seus sonhos e úteis para as suas criações, sejam elas as cores inacessíveis do fundo do mar ou a amizade que encontraram numa povoação hospitaleira. Mas mesmo quando a existência de filhos pequenos aconselhava mais prudência, Rik e Elisé mantiveram-se fiéis aos seus valores, artísticos e humanos. Chegaram a partir sem bagagem para as Antilhas holandesas, pernoitando na praia – convém lembrar que o clima é ligeiramente mais agradável naquela latitude, pelo que a aventura, sendo-o, não era tão penosa como seria, por exemplo, na Figueira da Foz – até Rik fazer uma exposição de pintura e conseguir dinheiro para construírem uma casa. Com um invejável curriculum de mergulho de mais de 1500 horas, Rik e Elisé renderam-se à Figueira da Foz em 2007, quando decidiram aproveitar uma deslocação a Santiago de Compostela, a propósito de uma exposição de Rik Lina na Fundação Eugénio Granell (das únicas no mundo interessadas em Surrealismo Actual), para conhecer o amigo Miguel de Carvalho, que até então só conheciam por e-mail. Os primeiros contactos entre o casal e o livreiro e editor figueirense surgiram a propósito da epistolografia desenhada de Cruzeiro Seixas a amigos, como Rik Lina, numa demanda que, aliás, resultaria na exposição “Naufrágio de Ilustraletrações – as letras pensam melhor quando desenhadas”, que esteve também patente no Centro de Artes e Espectáculos (CAE) em Novembro de 2007. Rik e Elisé vieram e acabaram por ficar hospedados na casa de Miguel de Carvalho, que o próprio admite ser “o hotel dos surrealistas estrangeiros em Portugal”. Quando partiram, levavam consigo a certeza de voltar. “Já cá tínhamos estado em férias, e sempre gostamos de Portugal”, explica Elisé, num inglês claro. “Gostamos mais do que de Espanha”, acrescenta, “sobretudo porque as pessoas são mais amigáveis”. Talvez até demais, atendendo à cultura holandesa que lhe corre nas veias. “Às vezes nem acredito que as pessoas sejam tão simpáticas, penso que querem algo de mim”, confessa a ceramista, que ainda hoje estranha que alguém que acaba de conhecer a cumprimente com dois beijos. Voltaram em 2008, primeiro em Abril, depois em Outubro. Em Janeiro deste ano regressaram, e pelo menos até Agosto poderemos encontrá-los na sua casa amarela, a 500 metros da do amigo Miguel de Carvalho; no mercado a comprar peixe, jeropiga e legumes; ou na mais modesta tasca a culpar a comida lusitana pela “barriguinha portuguesa”, que já notam, enquanto pedem mais um petisco. Também é provável encontrar Rik na praia, a recolher da natureza tudo, ou quase tudo, o que precisa para criar os pigmentos que depois, de forma automática, algures entre o humano e o animal, o racional e o irracional, transforma em arte, em cor, em textura, em vida.
A primeira tela que Rik pintou na Figueira tem mais de 5 metros quadrados e chama-se “dia da liberdade”, em alusão à data, do ano passado, em que foi criada. Já depois de chegar definitivamente à Figueira, Rik Lina realizou uma obra sobre um velho e “horrível” lençol que encontraram na casa amarela, num gesto de reciclagem artística em que só se acredita quando Rik vira o avesso do quadro e deixa visível o padrão de mau gosto do antigo lençol. Mas as obras ‘made in Cabo Mondego’ são muitas, muitas mais.
No Cabo Mondego, Rik e Elisé estão em casa, e isso sente-se. Os amigos, e os mais que vierem por bem, também se sentem em casa. Mesmo com dezenas de linóleos espalhados pelo sofá (*). Mesmo com as embalagens de manteiga e biscoitos transformadas em recipientes para areia e terra, que peneira e mói, até estarem perfeitas para os seus pigmentos únicos. Mesmo com os preparativos para a exposição dos seus 50 anos de pintura, que terá lugar na Fundação José Rodrigues, no Porto, já em Agosto, e onde irá expor telas de 18 metros quadrados lado a lado com quadros de dimensões muito reduzidas, mas onde cabem os sonhos do Cabo Mondego. Ainda assim: o sorriso de Elisé e as suas improváveis cerâmicas, a energia tranquila de Rik e as suas obras vibrantes de cor e movimento, fazem-nos sentir em casa. Afinal, como disse o Conde de Lautréamont, o Surrealismo é “belo como o encontro casual entre uma máquina de costura e um guarda-chuva numa mesa de dissecção”.
(*)“diálogos”
Uma edição artesanal DSO de homenagem a um amigo surrealista já ausente – Mário Cesariny – recebeu o nome de “DIALOGOS”. São 150 linóleos, cujo conteúdo corresponde exactamente a trabalhos colectivos realizados entre estes três amigos: Mário Cesariny, Rik Lina e Miguel Carvalho.

Notícia de Andreia Gouveia In Jornal " O Figueirense" - edição online - Ano 90 - Número 5612- Sexta-feira 15 de Maio de 2009

sábado, 16 de maio de 2009

X Convívio Filenos


Finalmente, tudo se encaminha para a realização do passeio-convívio pelo Douro unindo e fazendo conviver 52 FILENOS, familiares e amigos.
A organização está a dar os retoques finais para que nada falte nesses dias.
Todos os que vão participar já receberam as últimas informações. Procurem acompanhar as recomendações dadas, para que tudo corra da melhor forma.
Vamos promover quatro actividades de enriquecimento pessoal e de grupo: canto, dança, fotografia e cultura. Não se esqueçam de fazer as inscrições atempadamente.
Certamente vão aparecer muitas outras iniciativas espontâneas que sirvam para promover o convívio entre todos.
A adrenalina já começa a subir, entre os filenos não se fala de outra coisa.
Até ao dia 10 de junho, não percam o autocarro...